Um olhar mais atento… “ao que mesmo?!”
— Pedro Assunção.
Eu me levanto da cadeira da sala de espera e o sigo em direção ao consultório. O Doutor abre e porta pra mim e nos sentamos à mesa.
— O que está havendo? – ele pergunta.
— Então Doutor, tô com um problema no joelho.
— Faz quanto tempo?
— Um mês, por aí.
— E você faz algum exercício físico?
— Boxe e natação.
“Pera. Por que ele só está olhando pra baixo? Que estranho. Será algo caiu? Será que quer ver meu joelho mais de perto? Mas eu tô de calça, nem dá pra analisar ainda. Será que tem algo de errado comigo? Bom, eu almocei, escovei os dentes…e o desodorante?” Dou uma fungada rápida e vejo que o desodorante está em dia.
— Pedro?
— Oi? Desculpe, me distrai – respondo enquanto balanço a cabeça para acordar.
— Sofreu algum impacto forte?
— Pior que não. Às vezes rola um treino físico que pega mais pesado. Posso ter me machucado num desses.
— Vamos até ali – e apontou até a maca.
Eu me deito, o Doutor vai mexendo no meu joelho de diferentes jeitos enquanto o aperta.
— Está doendo aqui?
— Não.
“Será que ele é tímido? Tudo bem se for, mas, pô, tô aqui faz um tempo e ele tá tocando no meu joelho. Isso aí é já intimidade médico-paciente. Se ele estivesse tocando sem meu consentimento seria assédio, mas eu consenti; então tá tudo bem. Se eu desenhar uma carinha no meu joelho será que ele vai parar de olhar pra ele também?”
— E aqui? – o Doutor continua.
— Também não – respondo já no automático.
Ele continua mexendo no joelho.
“Vai que ele é um japonês ultraconservador e fechado. Mas porra, nos tempos dos samurais, não olhar o inimigo era uma falta de educação séria. E a gente nem é inimigo. Que eu saiba, né?! Tudo bem que gente branca como eu é inimigo de muita gente, mas eu não tenho dívida histórica com os japoneses. Aposto que até os doutores vesgos olham para os pacientes…”
— Ai….
Ele toca de novo.
— Ai… é esse o ponto – eu falo e nada dele me olhar.
Voltamos à mesa e ele continua:
— O diagnóstico é o seguinte…
“Parando pra pensar, pode ser o problema dele também. Será que é uma ex-namorada. Se bem que, pela aliança, ele é casado. Pode ter brigado com ela. Ouuu ela pode ter brigado com ele. Ele pode ser bem mal caráter e ter traído a coitada da japonesinha. Mas porque uma japonesa?! Agora eu que sendo conservador…”
Ele abre a porta do consultório, me despeço, desço de elevador, quando chego na rua, paro 1 segundo e penso: “o que ele disse mesmo?”