Corações e cinzas

Um relacionamento em crise, uma locadora de fitas e uma amizade que o mundo precisava conhecer.

Ela o ama com todas suas forças, declarações e ansiedades. Ele. Ele faz amor com os ciúmes, as tatuagens e os sorrisos. Passaram por muitas estreias. Conhecem seus mundos e seus preços também. Mas não são muito bons em se doar. Às vezes, ele não a enxerga. Às vezes faz até demais. Já ela, se esconde na ironia. Eles se sentem só. E sabem disso

Nos seus planos está um casal. Um cachorro e uma gata. O Rex vai ensinar a levantar de madrugada para acabar com o latido, a ter energia para brincar depois de um dia de trabalho, a dizer sim para uma cara de coitadinho… A paciência vão aprender com a Summer. Afinal, gatos são os adolescentes do mundo animal.

Mas antes disso, se perdem. Brigas, presentes, inseguranças, desejos. Ela não é a mesma do começo. Ele também não. Transformaram um ao outro. E no fim, se encontraram em outras pessoas.

Os dois vão casar este ano.

*

Quando eu era menor, vivia em uma locadora. Lembro que toda sexta estava lá, passeando por prateleiras de sonhos e aventuras em forma de fita. Voar de galho em galho ou na pista de corrida? Lutar até a morte ou salvar a princesa? Escolher uma só era praticamente impossível. E o final de semana inteiro jogando videogame era pouco para quem tinha todo tempo do mundo.

Na segunda à noite, a fita estava na mão. Quentinha porque acabou de sair do meu videogame. E quando novamente entrava naquela simpática casa, tentava ser invisível. Ou quem sabe, a dona me esqueceria enquanto trocava receitas com minha mãe. Pura imaginação. Porém a tristeza da devolução era recompensada pelo entusiasmo de um novo jogo.

A locadora se transformou com o tempo. Virou loja de CDs. De DVDs. De produtos de limpeza… Mas continuava sempre ali, no mesmo lugar. Uma infância intocável em meio a prédios altos e sem graça.

Hoje ela foi demolida.

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15 dias… Ou serão 17 meses? 20 anos? Sintonia é mesmo uma coisa difícil de medir. Muitas vezes, ela simplesmente acontece. E com essa não foi diferente. Uma amizade que desde o início é fiel como uma torcida e eterna como a rua. Parece até, que veio dos quadrinhos.

Nós passamos por muito: sobrevivemos às festas de 15 anos, ao pai dele bêbado, às namoradas loucas – tivemos um infarto quando a Bruna pisou no Playstation. Resistimos ao meu tio chato, à recuperação, às tentações da cachaça – ok, nem todas às tentações.

Assisti àquele coração, fácil como de um cachorro, fazer as maiores as cagadas e sofrer grandes decepções. Mas também o vi crescer e se tornar um cara foda, que todo mundo admira. Um cara que o mundo precisava conhecer.

Esta semana ele mudou de país.

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É…
São tempos de mudanças.

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